Técnicas da Pintura no Século XX
ACRÍLICA
A tinta acrílica é composta por pigmentos aglutinados com cola plástica ou resina sintética acrílica. Seca rapidamente e possui uma enorme gama de possibilidades estéticas: pode tanto ser diluída para um conseguir um efeito transparente e brilhante, aproximando-se de um visual aquarelado, quanto concentrada até obter um aspecto denso e pastoso, mais similar às tintas a óleo. Inúmeros aditivos podem ser misturados à tinta, a fim de conseguir resultados variados. Outro aspecto extremamente importante para a popularização da tinta acrílica é o fato de aderir a inúmeras superfícies com facilidade: tecidos, papel, madeira etc. Além disso, ela faz menos mal à saúde do que tintas a óleo, porque usa água como solvente.
Compostos acrílicos começaram a ser sintetizados na metade do século XIX e, na década de 1910, o químico alemão Otto Röhm sintetizou uma tinta com aglutinante acrílico. Essas primeiras tintas acrílicas serviam principalmente para pintura da parede das casas e para fins industriais. Apenas em meados de 1950 as primeiras tintas acrílicas voltadas para artistas seriam comercializadas.
As tintas acrílicas demoraram algumas décadas para se popularizar no meio artístico, principalmente por não serem capazes de simular os efeitos produzidos com tintas a óleo, uma vez que secavam rápido demais. Era necessária uma nova ideia estética para acompanhar essa nova técnica – e ela foi encontrada principalmente na forma da arte pop e do expressionismo abstrato do final dos anos 1950 e durante a década seguinte, com obras que favoreciam campos de cor homogêneos e chapados, linhas fortemente delineadas e intensidade cromática. A tinta acrílica passou a representar uma nova ideia de pintura, afastada da tradição centenária da tinta a óleo. A partir de então, a técnica se popularizou e novos artistas passaram a se debruçar sobre o material e a descobrir as inúmeras outras possibilidades que ele carrega. Roy Lichtenstein, Andy Warhol, Mark Rothko, David Hockney, Robert Motherwell, Helen Frankenthaler e Bridget Riley foram alguns dos mais famosos artistas a usar a técnica acrílica em meados do século XX, com resultados plásticos notadamente diferentes.
Frankenthaler, que substituiu o óleo pela acrílica, explica o porquê da troca:
Disseram-me que elas [tintas acrílicas] secam mais rápido, o que é verdade, e que retêm sua cor original, o que também é verdade. Diria que a durabilidade da tinta, sua luminosidade, e o fato de dissolver-se em água e não terebintina: tudo isso fazia a pintura abstrata mais fácil. Como a pintura necessitava de um tempo cada vez menor de secagem, de cada vez menos profundidade, os materiais que surgiam tornavam esses aspectos mais óbvios[1].
Diversos estudos acerca da conservação de obras produzidas com tinta acrílica vêm sendo realizados, mas, apesar disso, os efeitos em longo prazo dessa técnica ainda são largamente desconhecidos. Por isso, especialistas recomendam que os artistas utilizem técnicas de conservação preventiva em suas obras.
ESMALTE SINTÉTICO
O esmalte sintético é composto por pigmentos aglutinados com resina sintética alquídica e um óleo secante. Possuem uma fluidez e corporeidade inigualáveis, sendo um dos materiais mais capazes de registrar o gesto do artista, a rapidez e o ângulo dos movimentos. Além disso, aderem a inúmeras superfícies, inclusive metálicas, possuem grande durabilidade, secam rápido, são mais baratas e resistentes às variações de temperatura, raios UV, luz e produtos químicos que as demais tintas. No entanto, a maioria dessas tintas não é feita para fins artísticos, o que pode causar problemas na conservação de obras de arte.
Alfaro Siqueiros é tido como o precursor do uso de esmaltes sintéticos para produção de obras de arte, já na década de 1930, quando esta tecnologia ainda era extremamente recente e usada apenas na construção civil e automotiva. A escolha da tinta sintética foi ideal para a produção de suas pinturas em murais externos – ela era resistente à umidade e mais barata que as tintas para artistas, ao mesmo tempo em que ainda apresentava grande intensidade de cor. Ao longo de suas viagens e suas amizades com diversos artistas, Siqueira procurou divulgar essa nova técnica – como em seu famoso workshop em Nova York em 1936, quando Morris Louis e Jackson Pollock entram em contato com o material e passam a experimentar com ele em busca de novas possibilidades. Franz Kline e Willem de Kooning são outros dois artistas que fizeram uso de esmaltes sintéticos ainda nos anos 1930. Alguns artistas que optaram por essa tinta também trocarem os instrumentos de pintura tradicionais por novos métodos de aplicação, como sprays e aerógrafos.
Os anos do pós-guerra viram surgir um surto de desenvolvimento tecnológico, principalmente nos EUA, o que fez com que diversas novas tintas fossem sintetizadas e popularizadas a preços baixos, disseminando definitivamente o esmalte sintético durante a década de 1950. Richard Hamilton e seu Independent Group faziam uso da tinta a base de nitrocelulose, desenvolvida para pintura automotiva; David Hockney preferia as tintas da marca Liquitex; Pollock, em suas famosas dripping-paintings, costumava usar tintas alquídicas à base de piroxilina, como as da marca Duco.
TÉCNICA MISTA
O termo “técnica mista” refere-se a qualquer trabalho de arte feito com mais de uma técnica. Uma pintura feita com aquarela e tinta acrílica; uma colagem de papéis e fotografias; uma assemblage composta de madeira, plásticos e materiais achados; uma escultura de bronze e tecidos; uma instalação com objetos de cerâmica e ferro – todos podem ser denominados trabalhos de técnica mista. A junção de variadas técnicas traz resultados plásticos únicos, misturando texturas, volumes, camadas, densidades, cores, opacidades etc., o que favorece a percepção tátil e tridimensional de uma obra. É interessante notar que “técnica mista” costuma referir-se a uma mistura de mídias visuais, enquanto trabalhos denominados “multimídia” envolvem mídias para além das artes visuais, ou que façam uso de mecanismos eletrônicos.
Embora o termo tenha se tornado popular na arte modernista, misturar técnicas para criar uma obra de arte é uma prática existente desde a antiguidade. Na Grécia Antiga, as esculturas em pedra eram pintadas com tinta e ornamentadas com vidro, pedras e bronze; no Império Bizantino, era comum usar folhas de ouro em afrescos e mosaicos; na Idade Média, gravuras eram estampadas e coloridas com aguadas; e muitas esculturas barrocas combinavam bronze, mármore e alabastro.
Apesar de a mistura de materiais ter permanecido constante nas esferas do artesanato e das artes decorativas, a “técnica mista” só foi reintroduzida na cena artística da alta cultura por volta de 1912, quando Pablo Picasso e Georges Braque realizaram suas colagens e assemblages cubistas. A partir de então, a ideia de que arte pode ser feita com qualquer material ou quaisquer misturas de materiais foi progressivamente ganhando força.
Muitos artistas contemporâneos se utilizam de técnicas mistas para criar suas obras, e os resultados inusitados gerados pela mistura de diferentes materiais, muitas vezes com um componente adesivo, podem causar grandes problemas de conservação. É importante prestar atenção aos aspectos estruturais e químicos na construção dessas obras, uma vez que cada combinação de técnicas e materiais é única e gera efeitos em longo prazo muitas vezes imprevisíveis, ao contrário das técnicas tradicionais “puras”, cujos efeitos são bem mais conhecidos.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ART HISTORY.NET. Acrylic Paint. In: Art Medium. Disponível em: <http://arthistory.net/acrylic-paint/>. Acesso em: 23 jun. 2016.
ART HISTORY.NET. Mixed Media. In: Art Medium. Disponível em: <http://arthistory.net/mixed-media/>. Acesso em: 23 jun. 2016.
CAPPITELLI, FRANCESCA. Difficulties In The Scientific Study of Synthetic Materials In Paints. In: Conservation Journal. Vol.34. London: Victoria and Albert Museum, primavera 2000. Disponível em: <http://www.vam.ac.uk/content/journals/conservation-journal/issue-34/difficulties-in-the-scientific-study-of-synthetic-materials-in-paints/>. Acesso em: 23 jun. 2016.
ISRAEL, MATTHEW. The Birth of Collage and Mixed-Media. In: Artsy. 06 fev. 2014. Disponível em: <https://www.artsy.net/article/matthew-the-birth-of-collage-and-mixed-media>. Acesso em: 23 jun. 2016.
JABLONSKI, E; LEARNER, T; HAYES, J; GOLDEN, M. Conservation Concerns for Acrylic Emulsion Paints: A Literature Review. In: Tate Papers, no.2. London: Tate Modern, outono 2004. Disponível em: <http://www.tate.org.uk/research/publications/tate-papers/02/conservation-concerns-for-acrylic-emulsion-paints-literature-review>. Acesso em: 23 jun. 2016.
MONROE, LAURA. A History of Acrylic Painting. In: ARTmine by Agora Gallery Chelsea, NY. Disponível em: <http://www.art-mine.com/for-sale/paintings-submedium-acrylic/history-of-acrylic-painting>. Acesso em: 23 jun. 2016.
MONT MARTE. History of Acrylic Paint. 02 jun. 2016. Disponível em: <http://www.montmarte.net/creativeconnection/articles/show/history-of-acrylic-paint>. Acesso em: 23 jun. 2016.
MUSTALISH, RACHEL. Modern Materials: Plastics. In: Heilbrunn Timeline of Art History. New York: The Metropolitan Museum of Art, 2000. Disponível em: <http://www.metmuseum.org/toah/hd/mome/hd_mome.htm>. Acesso em: 23 jun. 2016.
OLIVEIRA, A; BELIZÁRIO, F; SOUZA, L. Materiais e técnicas pictóricas no Brasil do século XX: o impacto da semana da arte moderna de 1922 e da segunda guerra mundial na produção artística nacional. In: Revista Brasileira de Arqueometria, Restauração e Conservação. Vol.1, N.3, pp. 126 – 129. Minas Gerais: AERPA Editora, 2007. Disponível em: <http://www.restaurabr.org/arc/arc03pdf/12_AliceHeeren.pdf>. Acesso em: 23 jun. 2016.
TATE. Mixed Media. In: Glossary. Disponível em: <http://www.tate.org.uk/learn/online-resources/glossary/m/mixed-media>. Acesso em: 23 jun. 2016.
[1]ANTONIO, EMILE; TUCHMAN, MITCH. Painters Painting: A Candid History of the Modern Art Scene, 1940–1970. New York: 1984, p. 82 apud JABLONSKI et al., 2004.
Comentários
Postar um comentário